“Meus senhores, como todos sabem há diversas modalidades de Estado. Os
estados socialistas, os estados capitalistas e o estado a que chegámos. Ora,
nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos”
Capitão Salgueiro Maia
Hoje, uma vez mais, vamos ouvir
inflamados discursos sobre o 25 de abril. Não tinha pensado/decidido escrever
sobre este dia, até porque tenho a certeza, outros o farão muito melhor que eu.
Quem tem conta no facebook costuma ser
“surpreendido” com a pergunta - “ Em que está a pensar Isidro António”?
Nem ligamos a essa pergunta porque é repetitiva e já não nos
surpreende. Hoje decidi ligar-me. – Em que estou a pensar?
Estou a pensar no “Estado
a que chegámos”. Quarenta e sete anos depois da celebração do vinte e cinco
de abril, estamos precisamente no mesmo estado, o “estado a que chegámos” senão
pior.
Outra pergunta que é usual fazer-se é – “Onde estava no 25 de
abril de 1974”. A esta pergunta nem todos poderão responder, porque alguns do
que o viveram já não estão entre nós ou porque ainda não eram nascidos ou
porque de tão pequenos, desse dia não têm memória.
Eu tenho memória desse dia e dos dias (época) anteriores e
dos dias posteriores até hoje ao “estado a que chegámos”.
Na manhã do 25 de abril de 1974, à semelhança dos meus
colegas, professores e “contínuos” tinha-me dirigido para a escola, frequentava
a Secção Liceal de Elvas do Liceu Nacional de Portalegre. Saí de casa sem saber
que nessa noite, madrugada, se tinha dado o 25 de abril.
Chegados ao liceu, os contínuos mandaram-nos regressar a
casa, sem paragens no caminho e ficarmos lá até ordem em contrário. Não me
lembro se nos deram alguma explicação do que estava ou tinha acontecido. Mas
logo nos apercebemos que algo de muito importante tinha acontecido. Cada um
cumpriu à risca a ordem, nessa altura não se discutiam “ordens”, obedecia-se.
Já depois de estar em casa tive a noção do que estava a
acontecer, até porque vivia numa cidade militar e viam-se as movimentações das
colunas militares. Penso que ainda nesse dia, ou no dia seguinte, contrariando
a “ordem” da minha mãe, tive a ousadia de me dirigir às imediações do Regimento
de Lanceiros 1, penso que era assim que se chamava o quartel na altura. Esse
dia ainda hoje está vivo na minha memória e a adrenalina que senti ao experienciar
esses dias. O 25 de abril não foi um dia, foram vários dias.
O que há de semelhante ou diferente ao “estado a que
chegámos” antes do 25 de abril de 1974 e o “estado a que chegámos” hoje.
Provavelmente, contrariarei muitas das opiniões, que hoje são
tidas como “politicamente” corretas/aceites.
Diz-se que o “estado a que chegámos”, estávamos antes do 25
de abril, era o de um país subdesenvolvido, pobre, onde se trabalhava de “sol a
sol”, iletrado, sem liberdade. Quase sempre se associa o conceito de liberdade
à falta de liberdade politica e de expressão. Como se a LIBERDADE fosse apenas
isto.
Diz-se que os pobres, os filhos dos trabalhadores, não tinham
condições para estudar. Sou filho de um pai trabalhador rural e de uma mãe
doméstica que tratava de quatro filhos. Não me lembro de algum dia ter passado
fome ou de não ter “nada” para comer. Não comia carne nem peixe todos os dias.
Mas comia, nem que fosse uma vez por semana, uma refeição de carne e outra de
peixe. Frequentámos eu e os meus irmão mais velhos a escola pública. Frequentei
o Liceu de Elvas. Escola pública das “elites”.
E não, nunca me senti discriminado.
Sou a excepção à regra? Não! Havia outros.
O “estado a que chegámos” hoje.
Há fome? Há, muita!
Trabalha-se de “sol a sol”? trabalha-se! Mais do que isso,
trabalha-se de noite.
Há desemprego? Há! Mais do que isso, há muitos que não querem
fazer “nenhum”
Há exploração? Há e muita!
Há quem viva à conta dos outros? Há e muitos!
Há quem não consiga pagar as contas? Há e muitos!
O que fizeram para melhorar as condições de vida dos
portugueses? Pouco, ou muito pouco. O que fizeram foi com a “herda” do estado a
que chegámos antes do 25 de abril. As reservas de ouro, que delapidaram e
roubaram. Fizeram-no com os rios de dinheiro vindo da Comunidade europeia, CEE.
Fizeram auto-estradas pagas pela CEE e que ainda hoje continuamos a pagar
porque as deram aos amigos para nos continuarem a explorar. Onde está a
melhoria de vida para os pobres de então e para os pobres de hoje? Os pobres de
então recebem pensões de miséria. Os pobres de hoje recebem subsídios e esmolas
do Banco Alimentar contra a Fome e de quem colabora com estas instituições. São
os pobres que alimentam o sistema, não são alimentados por ele.
Chegámos à liberdade.
Há liberdade? A pergunta do milhão!!
Quer responder por mim?
Só para ajudar um pouco na resposta. Ainda ontem vi na página
de um amigo do facebook dizer que só deveríamos emitir a nossa opinião desde
que dominemos os assuntos… pergunto se isso é liberdade ou castração dessa
liberdade? “Ainda por cima” esse amigo é jornalista. Onde está então a
liberdade de expressão?
Existe liberdade política?
Chegámos ao estado em que uma
pessoa, Ana Gomes, pede a ilegalização de quinhentas mil (500.000) pessoas.
Chegámos ao estado em que os "donos disto tudo" se permitem apropriar do 25 de abril. A coberto de desculpas, do "estado em que se vive", apenas quem eles autorizam, podem celebrar o 25 de abril.
Este é o “estado a que
chegámos”.
Outro estado precisa-se.
Outro 25 de abril precisa-se.
Outro Salgueiro Maia precisa-se
Não quero fazer analogias. Mas, será que o André Ventura é o
Salgueiro Maia de hoje? Sem armas físicas, mas com a melhor arma de todas, a PALAVRA, e por isso tantos temem o novo
25 de abril?.