domingo, 18 de março de 2018

A Nostalgia


Como sói dizer-se, fui nascido e criado, na sempre bela cidade de Elvas, mais concretamente, em Santa Rita, numa casa velha, tosca e bela, como diz o poeta José Régio, como se fora feita, para eu morar nela, e morei até aos vinte 23 anos. Naquele tempo eram sete famílias que moravam naquele conjunto de casas. A mim bastava-me saltar o muro, que separava a minha casa, do recreio da escola primária de Santa Luzia. Lembro-me bem, era sempre o primeiro a chegar à escola, mesmo antes dos contínuos, era assim que se chamava aos agora auxiliares de acção educativa. Era mesmo chamado por estes de o “galo da madrugada”, talvez venha daí este meu “péssimo hábito” de detestar chegar atrasado ao quer que seja. Lembro-me da Carlota, da Teresa, do António Brissos, do Zé Manel, da Jerónima, do Chico, da Joana, do João, do Arsénio, do Henrique, do Dinis e do Zé, dos meus primos, Celeste, Júlio e Ana Maria, Lembro-me de uma casa pequena, mas sempre cheia de gente, sempre cabia mais um. Lembro-me dos paladares da comida da minha mãe, que todos apreciavam muito. Lembro-me dos natais e da fogueira, das cantigas ao Deus menino. Lembro-me dos acampamentos dos ciganos, com os quais brincávamos e brigávamos. Lembro-me do ribeiro que atravessava a quinta do Bispo e corria ao longo da estrada. Do tanque que aproveitava a água vinda da cascata da mesma quinta e onde as mães e irmãs mais velhas lavavam a roupa. Lembro-me dos “cavalos” a correrem no esgoto, tapado, que atravessa o terreno. Era assim que chamávamos às pedras que rebolavam no esgoto, quando chovia muito e este enchia. Lembro-me de apanhar rãs nas fontes e no ribeiro. Lembro-me de apanhar caracóis nos muros velhos das quintas do Bispo e do Salvador. Lembro-me de apanhar erva para dar às galinhas e aos coelhos. Lembro-me do projecto que iria ligar o bairro de Santa Luzia ao Bairro da Piedade. Lembro-me das marcas que deixaram nas paredes a assinalar por onde passaria a estrada. Lembro-me de a minha mãe dizer que aquilo nunca seria feito. Lembro-me de passear por aqueles campos com o meu “Rusty” um setter inglês, o melhor cão que já tive. Lembro-me do canavial que ladeava o ribeiro. Lembro-me da “bebedeira” que apanhei aos sete/oito anos provocada por um maço de tabaco “mata ratos”. Serviu de lição, talvez por isso não apanhei o vício de fumar, nem de me embebedar, aliás aquela foi a minha única “bebedeira”. Belos tempos, sim belos tempos. Há vinte anos que deixei de morar em Elvas, embora vá com regularidade, partia-se-me a alma cada vez que ia ver aquele conjunto de casa abandonadas. No final do ano de 2017 um amigo residente em Elvas, mas a trabalhar em Portalegre disse-me -  tem de ir ver a moradia que estão a fazer no sitio onde morou. Não resisti, e fui quase de propósito a Elvas para ver a casa. Gostei, claro que gostei de ver, que aquele espaço, voltou a ter vida. Estive ali algum tempo, só, a rever mentalmente como era aquele espaço e como é agora. Fiquei muito contente de continuar a ver o chafariz na parede da nova casa. Aos novos proprietários desejo a maior felicidade e não esqueçam esse espaço já teve muitas histórias de vida.   

2 comentários:

  1. Gostei imenso, amigo.
    Um abraço.
    Vitor Choças

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    1. Obrigado amigo. Não sabia que também tinhas página aqui. Fui espreitar mas não tens nada escrito. Escreve alguma coisa. Serve de terapia.

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