Como sói dizer-se, fui
nascido e criado, na sempre bela cidade de Elvas, mais concretamente, em Santa Rita, numa casa velha, tosca e
bela, como diz o poeta José Régio, como se fora feita, para eu morar nela, e
morei até aos vinte 23 anos. Naquele tempo eram sete famílias que moravam
naquele conjunto de casas. A mim bastava-me saltar o muro, que separava a minha
casa, do recreio da escola primária de Santa Luzia. Lembro-me bem, era sempre o
primeiro a chegar à escola, mesmo antes dos contínuos, era assim que se chamava
aos agora auxiliares de acção educativa. Era mesmo chamado por estes de o “galo
da madrugada”, talvez venha daí este meu “péssimo hábito” de detestar chegar
atrasado ao quer que seja. Lembro-me da Carlota, da Teresa, do António Brissos,
do Zé Manel, da Jerónima, do Chico, da Joana, do João, do Arsénio, do Henrique,
do Dinis e do Zé, dos meus primos, Celeste, Júlio e Ana Maria, Lembro-me de uma
casa pequena, mas sempre cheia de gente, sempre cabia mais um. Lembro-me dos
paladares da comida da minha mãe, que todos apreciavam muito. Lembro-me dos
natais e da fogueira, das cantigas ao Deus menino. Lembro-me dos acampamentos
dos ciganos, com os quais brincávamos e brigávamos. Lembro-me do ribeiro que
atravessava a quinta do Bispo e corria ao longo da estrada. Do tanque que
aproveitava a água vinda da cascata da mesma quinta e onde as mães e irmãs mais
velhas lavavam a roupa. Lembro-me dos “cavalos” a correrem no esgoto, tapado,
que atravessa o terreno. Era assim que chamávamos às pedras que rebolavam no
esgoto, quando chovia muito e este enchia. Lembro-me de apanhar rãs nas fontes
e no ribeiro. Lembro-me de apanhar caracóis nos muros velhos das quintas do
Bispo e do Salvador. Lembro-me de apanhar erva para dar às galinhas e aos
coelhos. Lembro-me do projecto que iria ligar o bairro de Santa Luzia ao Bairro
da Piedade. Lembro-me das marcas que deixaram nas paredes a assinalar por onde
passaria a estrada. Lembro-me de a minha mãe dizer que aquilo nunca seria
feito. Lembro-me de passear por aqueles campos com o meu “Rusty” um setter
inglês, o melhor cão que já tive. Lembro-me do canavial que ladeava o ribeiro.
Lembro-me da “bebedeira” que apanhei aos sete/oito anos provocada por um maço
de tabaco “mata ratos”. Serviu de lição, talvez por isso não apanhei o vício de
fumar, nem de me embebedar, aliás aquela foi a minha única “bebedeira”. Belos
tempos, sim belos tempos. Há vinte anos que deixei de morar em Elvas, embora vá
com regularidade, partia-se-me a alma cada vez que ia ver aquele conjunto de
casa abandonadas. No final do ano de 2017 um amigo residente em Elvas, mas a
trabalhar em Portalegre disse-me - tem
de ir ver a moradia que estão a fazer no sitio onde morou. Não resisti, e fui
quase de propósito a Elvas para ver a casa. Gostei, claro que gostei de ver,
que aquele espaço, voltou a ter vida. Estive ali algum tempo, só, a rever
mentalmente como era aquele espaço e como é agora. Fiquei muito contente de
continuar a ver o chafariz na parede da nova casa. Aos novos proprietários
desejo a maior felicidade e não esqueçam esse espaço já teve muitas histórias
de vida.
Decidi criar este blog "Nem tanto à terra nem tanto ao mar" para iniciar o que me vai no pensamento. Não, não é engano, quero mesmo que se chame assim. Já sei que não se diz assim, mas eu digo como quero, ou não posso? Não? Mas afinal de quem é o blog? É meu, fui eu que o criei, ou foste tu? Esclarecidos? Sim? Ok! então vai chamar-se mesmo "Nem tanto à terra nem tanto ao mar" sim porque eu gosto de ser do contra, ou talvez não, a ver vamos.
Gostei imenso, amigo.
ResponderEliminarUm abraço.
Vitor Choças
Obrigado amigo. Não sabia que também tinhas página aqui. Fui espreitar mas não tens nada escrito. Escreve alguma coisa. Serve de terapia.
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