quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Porque desacredito?

 

A decepção é o desacreditar mais trágico que um coração pode sentir

(desconhecido)

Desde o meu nascimento, fui envolvido na fé cristã, católica apostólica e romana. Fui baptizado ainda não tinha três meses. Frequentei a catequese até aos meus dozes/treze anos. Fiz a primeira comunhão aos sete. A profissão de fé por volta dos nove/dez. O crisma aos doze. Fui “sacristão”, ajudava nas missas. Casei na igreja católica, Sé de Elvas, ou melhor dito, igreja de Nossa Senhora da Assunção.

Eduquei os meus filhos nesta mesma fé. Todos eles e são três, receberam os sacramentos da religião católica. À minha semelhança, foram baptizados bebés, frequentaram a catequese, receberam o “pai nosso”, fizeram a primeira comunhão, a profissão de fé e o crisma, foram “sacristães”, ajudaram à missa na igreja de S. Lourenço em Portalegre. O mais velho também já casado pela igreja católica, em Bruxelas.

Antes de acreditar em Deus, em Cristo e no Espírito Santos, acreditei nos homens e nas mulheres.

Comecei por acreditar na minha mãe. Foi ela que me quis baptizado. Foi ela que quis que frequentasse a igreja. Ah! Já me esquecia, e porque estamos muito perto dos “santinhos” lembrei de repente, que no dia um e dois de novembro, normalmente prolongava-se por mais uns dias, de todos os anos e durante muitos anos, mesmo depois de ter deixado de frequentar a catequese, percorria as ruas da cidade, dos bairros de Santa Luzia, das Caixas, da Piedade e da Boa Fé, a pedir os “santinhos” que naquele tempo não era pedir para “proveito” próprio.

Tinham-me ensinado que deveria bater às portas e, com uma bolsa de pano aberta e de braços esticados dizer “uma esmola para as almas do outro mundo”, rara era a vez, que nessa mesma bolsa, não caia uma moeda. Conseguia angariar uma boa “porção de dinheiro”. Pertencendo a uma família humilde e pobre, esse dinheiro ou parte dele, podia vir “facilitar” as dificuldades do dia-a-dia, durante alguns dias, mas nunca, nunca mesmo, foi retirado um centavo que fosse. Todo ele, sempre, foi entregue a uma “tia”, tia Rita, que o entregava ao padre numa paróquia na cidade. Este, certamente entregava-o a Deus, já que as “almas do outro mundo” coabitavam com Ele.

Mas, ao que ia, antes deste descaminho, qual é o filho que não acredita na mãe? Eu sempre acreditei na minha, mesmo quando às vezes lhe dizia ou achava que não tinha razão. As mães têm sempre razão. Com essa certeza, passei a acreditar também nas outras mulheres, catequistas, umas freiras e outras laicas, porque elas também são mães, mesmo as freiras, porque sempre diziam “meu filho” não digas isso… não faças assim… ou seja uma mãe que quer o melhor para o seu “filho”.

Depois das mulheres, passei a creditar nos homens, nos padres, no que diziam na missa e fora dela. Acreditava que ali não havia desvios, não havia pecado, eram homens virtuosos e “santos” como Jesus Cristo. Embora acreditasse? ou quisesse acreditar, muito novo, ainda na frequência da catequese, apercebi-me que afinal, os padres não são assim tão virtuosos e tão “santos” quanto isso, também tinham e cometiam os seus “pecados”. Estes comportamentos de “pecado” não me fizeram desacreditar na fé de Deus, mas fizeram-me desacreditar na “fé” do homem.

Como é possível que estes homens/padres, incutam no espírito de um jovem que se tem de confessar a ele, para poder comungar, por ter pregado uma mentirinha ao pai, à mãe ou a um amigo, quando ele, para além da mentira, comete o crime de abuso sexual a uma criança.

Como é possível que um dignatário, bispo, da igreja católica, oculte estas monstruosidades? E se ache no direito de não as denunciar.

Como é possível que o mais alto dignatário da nação, presidente da república, considere que trezentos ou quatrocentos casos, não são assim tantos quanto isso?

Como é possível que um primeiro ministro, venha publicamente defender esta posição e querer fazer-nos pedir desculpa ao presidente da república.

O comentador/presidente da república, depois de ter levado tantos “puxões de orelhas” e não aguentando mais, vem dizer hoje, mas não convencido, só o faz porque já não aguentava tantos “puxões” - peço desculpa…não devia pedir desculpa, devia fechar a “matraca” e falar só quando os assuntos têm a ver com os soberanos interesses do estado. Devia ter observado e aprendido com o comportamento da rainha inglesa recentemente falecida, que apenas uma vez deu uma entrevista e nunca comentava publicamente o quer que fosse, certamente não era porque não tivesse opinião, mas sim, porque o sentido de estado assim obrigava.  

Por tudo isto, há muito tempo que desacredito, na fé em Deus e na fé nos homens.   



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