Estamos no ano da
graça, de mil novecentos e oitenta e um, (1981) mês de Março, tenho por esta
altura vinte e dois anos.
Tinha terminado a
dezoito de Dezembro de mil novecentos e oitenta, (1980) o serviço militar
obrigatório.
Estava parado, sem nada
que fazer, sem nenhuma ocupação e sem nenhum rendimento. Os dias sucediam-se
uns à frente de outros e nada acontecia para alterar esta situação. Tinha
necessidade precisamente do contrário, de estar ocupado, ainda hoje tenho essa
necessidade, e sobretudo de ter um rendimento que me sustentasse.
Se a memória não me
falha muito, creio que estávamos no meio de Março, ao cruzar-me numa das ruas
da cidade de Elvas, rua de Alcamim, com uma amiga e ex-colega de escola, que já
estava “assegurada”, trabalhava no registo civil de Elvas, lamentei-me desta
minha inactividade e falta de perspectivas de futuro.
- Acabei a tropa no
final do ano. Não sei que hei-de fazer agora.
- Porque não concorres
à guarda? (GNR). Como sabes o meu pai é lá cabo, (Cabo Manteigas) vai ter com ele
e diz-lhe que estivemos a falar.
Como eu mais tarde vim
a aprender, um Cabo da GNR por estes anos, era um Senhor. Quero com isto dizer
que em muitas localidades era a AUTORIDADE. Respeitado e obedecido por todos.
Os ciganos, repito! os ciganos, sem medo das palavras, tinham um respeito
incomensurável aos guardas em geral e aos Cabos em particular e na mesma medida
eram por estes respeitados, o que não impedia que uma ou outra vez, se tivesse
de empregar a força para fazer cumprir algum preceito legal. .
Infelizmente tal deixou
de acontecer.
Embora me tenha “dado
bem” na tropa, nunca me imaginei a seguir a vida militar, pese embora, tenha
recebido incentivos por parte se superiores hierárquicos, para seguir esta
carreira profissional.
O “bichinho” da
conversa entrou na minha cabeça, começou de imediato a fazer ninho, fazia
sentido, porque não? o que é que tinha a perder? quanto muito, tinha era a
ganhar.
Não dei tempo a que ele
abandonasse o ninho. Dou comigo a dirigir-me ao posto da GNR que, por esta
altura, estava sediado na Rua de São Lourenço em plena cidade de Elvas, a dois
passos da rua de Alcamim.
Era um edifício velho,
entrei, não havia ninguém no hall de entrada, subi as escadas e bati a uma
porta que se encontrava semifechada, podia dizer semiaberta, mas não, o modo
como eu via todas as portas eram fechadas.
Apareceu-me um guarda, disse
a medo.
- Quero falar com o
cabo Manteigas.
- O que é que você quer
falar com o cabo Manteigas?
Hesitei, apesar de ter
sido militar, acho que as minhas pernas tremiam.
O bichinho que estava
na minha cabeça, falou por mim.
- É um assunto
particular.
O guarda, virou-se
ligeiramente de lado, sem ter saído da minha frente, gritou para a sala
contígua.
- Cabo Manteigas chegue
lá aqui, está aqui um fulano que quer falar consigo.
Da outra sala oiço
alguém pronunciar.
- Só um momento, já
vou.
Os minutos de espera,
poucos, ou quase nenhuns, pareceram-me uma eternidade.
Por fim apareceu o Cabo
Manteigas, pessoa que eu conhecia pessoalmente, por ter frequentado a casa
dele, e ter dado “explicações” de geometria descritiva à filha e minha
ex-colega de escola, que se queria apresentar a exame externo, para completar o
sétimo (7º) ano do liceu, correspondente aos dias de hoje ao 11º.
Muito afável,
cumprimentou e perguntou-me.
- O que é que o traz
cá?
- Estive a falar com a
Graça, e ela sugeriu-me que viesse falar consigo “pra” “meter os papéis” “prá”
guarda.
- Oh! Que boa ideia, é
já. Espere só um pouco.
Dirigiu-se a um armário
onde guardava os formulários, voltou logo depois com uma série de folhas A4.
- Sente-se aqui nesta
secretária e vá preenchendo. Se tiver dúvidas pergunte.
- Obrigado.
Sentei-me e comecei a
preencher as folhas, não me lembro se tive dúvidas no preenchimento, mas devo
ter tido…
No final entreguei-lhe
as folhas, ele verificou, e disse:
- Está tudo devidamente
preenchido. Aguarde que há-de receber uma notificação, para se apresentar numa
Unidade da Guarda para fazer exames de admissão.
Naquela altura, as
forças policiais, tinham de informar sobre a “conduta de cidadão” não sei se
era este o termo correto, mas não devia ser, já que este me ocorreu agora, mas
o que se pretendia era que todo o candidato à guarda, e não só, extensível a
todo o sector do estado, tinha de ter uma informação de qual era o seu
comportamento na sociedade e só seriam aceites, como candidatos, os que
tivessem “a folha limpa”.
Despedi-me com um
- Muito obrigado.
Naquele tempo, não
esqueçamos que estamos em 1981, não haviam “concursos públicos” para admissão
ao serviço do estado.
As candidaturas à
guarda estavam ininterruptamente abertas, embora as provas de admissão,
escritas, médicas e físicas, obedecessem como é natural a uma calendarização.
(esta história tem
seguimento)
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