Bar/Sala - Casa de Reclusão/Elvas |
Era seu Comandante o “famoso” e conhecido Major Sá, figura
incontornável e muito discutida, por aquilo que se dizia à boca fechada, no
meio social Elvense, pela sua brutalidade,
no tratamento, quer em termos humanos quer em termos militares.
O homem tinha estado na
guerra nas ex. colónias ultramarinas. Numa dessas campanhas, se a memória não
me falha, penso que na Guiné, perdeu a visão de um dos olhos, para além de
outras mazelas, muitas delas grande também, e a mão, já não me recordo muito
bem se a direita ou esquerda, mas parece-me ainda ver o coto do antebraço
direito a terminar na parte que corresponderia à mão com uma espécie de dois
dedos.
O homem tinha cavalos
de sua propriedade particular, nas instalações/casas, pertencentes ao
aquartelamento que ficam na frente e na parte exterior. Escusado será dizer
que, este digno oficial do exército
português tinha como empregados,
os próprios militares do aquartelamento, os quais tratava a ferro e fogo.
O que era importante
para ele, não eram os militares, eram os cavalos.
Hoje seria acusado de
peculato. Nesta altura, estes vícios constituíam um “Status”, pelo que era considerado normal estas regalias e
mordomias e ninguém ousava pensar sequer,
que aquilo era um “roubo”. Senão, mais de metade, para não dizer todos, dos
oficiais das forças armada e forças militarizadas, GNR, GF, Polícia de
Segurança Pública e dirigente do funcionalismo público teriam ido cumprir penas
de prisão na “minha” Casa de
Reclusão. Mas, não! nunca lá vi nenhum! menos ainda, por “tais crimes”.
Ainda estou a ver o “carocha”
preto, transportar as refeições dele e da família, para além de o ir apanhar a
ele em casa, transportar as filhas e a esposa. Permitam-me a ousadia, as filhas
e a esposa, espanhola, para além de muito bonitas eram muito simpáticas,
especialmente a filha mais velha era, ainda deve ser, porque a beleza é inata,
linda de morrer, acho que, platonicamente, ainda cheguei a apaixonar-me, só que
era areia demais para a minha camioneta, com a agravante que nem camioneta
tinha, mas não fui o único.
Ela ao invés, ao que se
dizia, na caserna, estava apaixonada pelo gajo mais feio, gordo, figura de
barril, mas tratava dos cavalos e ajudava-a a montar... naturalmente o cavalo,
ou égua, acho que era égua. Bem que se aproveitou a passar as mãos numa tão
grande beleza.
Bom! A verdade é que ainda
hoje, infelizmente, assim continuamos. Quem
está no poder, continua com as mesmas regalias, mordomias, e alcavalas. E
nós, os pagantes, continuamos na mesma, calados que nem ratos e pior ainda,
continuamos a pensar que faz parte do “Status”.
Paga Zé!
Quando comecei este
texto, nem sequer tinha pensado, em falar do comandante e do seu “status”. Era
para falar sobre os pedaços de mim, pois então, vamos a eles.
Dada a fama de que o
comandante Sá gozava na cidade, a minha mãe quando soube que eu iria para a
Casa de Reclusão ficou apavorada. Deve ter imaginado que eu iria ser sovado
todos os dias e o fim dos meus dias estaria próximo. E não, não estou a
exagerar, os do meu tempo e mais velhos lembrar-se-ão desta figura. O homem era
temido na cidade. Não sei se ainda é vivo, mas se for, certamente concordará
comigo.
Pessoalmente, não tenho
nada que dizer do Comandante Sá, quer em termos de tratamento humano quer em
termos de tratamento militar, à parte uma historieta, que se me lembrar conto
no próximo texto.