Sou o segundo a contar da direita
Após o dia da
incorporação, no dia seguinte, cinco de Setembro de mil novecentos e setenta e
nove, pelas 07h30, depois de tomado o pequeno almoço, já o descrevi na página
anterior, teve início a instrução militar.
Pertencia ao 4º pelotão
com o número 648, a partir deste dia deixámos de ter nome e éramos chamados e
conhecidos pelos respectivos números.
Ainda tenho, mais ou
menos, relativa boa memória, mas sempre senti dificuldade em “guardar” nomes
das pessoas por muito tempo. Infelizmente, não me lembro do nome de nenhum
camarada que comigo compartilhou esta vivência. Talvez porque sempre fomos um
número… sei lá.
Ao invés, penso ainda
recordar o nome do comandante de pelotão, aspirante miliciano Prezado, natural
de Estremoz, quanto ao furriel e ao cabo, por mais voltas que dê neste “disco rígido”,
não encontro nada, apagou-se por completo, azar…ainda não havia a tal “nuvem”
que guarda tudo. Mas, tenho memória de terem sidos excelentes seres humanos,
exigiam o que tinham de exigir, naturalmente também porque exigiam deles, mas
sempre “dentro dos limites”.
A instrução militar,
como o próprio nome indica, tinha a ver com a vida de um futuro militar. Ordem
Unida, marchar muito, marchava-se em passo de corrida para tudo e para nada. Quedas
na máscara, consistia em se ir em formação de ataque, composta por uma secção,
que são duas esquadras no total de onze homens, e reforço homens, porque
naquela altura, ainda não havia mulheres no exército. Hoje serão onze militares ou onze pessoas de género indefinido? armamento, tínhamos de conhecer
as armas e o seu funcionamento, a famosa G3, e outras, desmontar, limpar e voltar a montar.
Tiro efectuado na carreira de tiro do Falcato. Será que esta carreira de tiro
ainda existe? Educação física, toda e mais alguma…legislação como o RDM –
Regulamento Disciplinar Militar e CJM - Código de justiça militar. As unidades e
regiões militares existentes, ah! naturalmente os postos (graduações) militares,
primeiros socorros, enfim uma panóplia de coisa que tinamos de saber.
Quase no final da
instrução que durava mais ou menos três meses de “vida dura” vinha a tão “desejada”
semana de campo.
Consistia esta “semana
de campo” na ida para o campo, num imaginário “teatro de guerra”. Felizmente
para todos nós a guerra nas ex. colónias ultramarinas já tinha terminado. Havia
sempre um inimigo que invadia Portugal, se a memória não me falha eram sempre
os espanhóis. Resquícios e medos do passado. Naturalmente ganhávamos sempre, ou
seja os espanhóis continuavam a ser derrotados…pudera…eles nem apareciam…uns
pelotões faziam de inimigo e outros de patriotas e assim se “brincava” às guerras.
Mas nisto somos bons,
enganarmo-nos a nós próprios e pior ainda, deixarmo-nos enganar. Acreditar que
ganhamos sempre, mas quem ganha são os outros, os que nos manipulam…no ainda
hoje “teatro político”. Podemos
continuar com manifestações, comissões de inquéritos parlamentares, demissões
ou exonerações fictícias, que tudo isto não passa por ser apenas, “uma semana de campo”. Só que neste
caso quem treina, brinca, são eles, políticos que, a cada dia estão mais
espertos.
Ainda me lembro, a
minha semana de campo foi invernosa. Choveu de dia e de noite. Andámos sempre
ensopados. Dormíamos três recrutas, numa tenda que armávamos com três panos de
tenda, tipo índio. Na “minha tenda” em vez de dormirmos três dormíamos quatro,
talvez por eu ser tão magro que não ocupava espaço… O motivo foi outro, depois
conto.
Não guardo má memória
deste lapso de tempo da minha vida, para ser sincero, “até gostei”.
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